carta amarela #20 – “faça algo que ama e nunca se sentirá cansado”
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Paris, 24 de junho de 2012
Queridos amigos,
Finalizando o curso, fizemos uma viagem de estudos para a Alsace, um lugar que eu nunca pensei em visitar. E é uma região linda, assim como todas as da França que tenho podido conhecer desde que cheguei. Viajamos todos juntos: pastry A, pastry B e os nossos chefs Didier e Thierry. Em três dias visitamos algumas cidades, tivemos almoços e jantares memoráveis e pudemos conhecer além da região, algumas particularidades relacionadas à nossa profissão. Do museu do chocolate até à produção de kirsch e conhaques conhecemos Christine Ferber.
Fomos até uma cidadezinha chamada Niedermorschwihr (favor tentar não entender ou ler o nome da cidade sob o risco de não conseguir terminar de ler minha carta). Lá é onde trabalha Christine Ferber. Ela faz, além de todo tipo de pâtisserie, as mais famosas geléias do mundo, num lugar chamado Au Relais des Trois Epis. Era dos passeios mais esperados. O ônibus que nos levava parou numa pracinha da igreja e fomos entusiasmados entrando na pâtisserie, já fechada. O cheiro de frutas pairava pelo ar e o cheiro de mais coisas gostosas emanava de uma janelinha de onde a gente podia espreitar a cozinha.
Falando em um francês suave para que pudéssemos a entender bem, contou um pouco da história da própria vida. Filha e neta de pâtissiers, seu pai nunca lhe deu uma única receita, a fez aprender sozinha, na marra, como fazer as coisas. Queria estudar na Ferrandi e não pôde. Veio a Paris e trabalhou até de graça, passou dificuldades financeiras, mas aprendeu o duro ofício da pâtisserie. Trabalhava 16 horas por dia, 6 dias na semana e se dedicou a vida toda nisso.
Seu pai dizia que era uma besteira ela fazer geléias, mas foi seu amigo Pierre Hermé quem lhe disse que aquelas eram as maiores maravilhas. Hoje em dia, já estabelecida no mercado, conhecida no mundo todo, com muitos livros publicados e com sua pequena e doce pâtisserie naquela cidadezinha da Alsace, ela ainda trabalha cerca de 12 horas por dia.
Ela nos disse: “certifique-se de fazer aquilo que ama”. Nos lembrou que tudo na vida é preciso esforço, é preciso pensar e realizar, e nunca ficar parado. Nada vem de graça. Na saída vimos os potes e potes de geléias, desde as mais comuns até geléias de cebola e riesling para se utilizar com carnes. Na despedida, pegou sua bengala e nos acompanhou até a saída. Com os olhos cheios d’água, após ouvir tantas histórias de paixão, e ver o esforço que ela faz até hoje, nos deu o último conselho: “faça algo que ama e nunca se sentirá cansado”.
Beijos ainda emotivos porém inspirados,
Gui
fotos :: Yu Hsuan Cheng
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