carta amarela #27 – 27

Paris, 9 de agosto de 2012

Queridos amigos,

Aos 26, continuei gritando de raiva. E explodindo de felicidade. Não consigo me controlar. Continuo falando sozinho em inglês. Fazendo discursos como se eu tivesse ganhado o Oscar. Falei muito em português. Mais ainda em inglês. Desisti do espanhol. E continuo batendo a cabeça pra aprender o francês.

Aos 26, dancei muito na frente do espelho. E em festas. E nas ruas. Deixei de ter vergonha alheia. Aliás, deixei de ter vergonha de quem eu sou. Aprendi a rir de mim mesmo. E a me levar menos a sério. Bati em todas as pilastras. Aposto que elas mudam de lugar enquanto durmo. Tropecei em todos os infinitos degraus de Paris. Desci rolando por alguns desses. Feito Penélope Cruz em Abraços Partidos. Tive uma dor de cotovelo colossal. Literalmente.

Me queimei. Me cortei. Sou feliz com minhas novas cicatrizes. Serão todas parte do meu ano #26. Continuo tendo muita fome o tempo todo. Tive dor de barriga de tanta manteiga francesa. Fiz amigos de nomes estranhos. Fiz amigos de todos os continentes do mundo. Muitas pessoas entraram na minha vida. Algumas pessoas se foram dela, também. Vi I’ve got the love da Flo e Niggas in Paris 12 vezes seguidas, ao vivo. If you escaped what I escaped you’d be in Paris getting fucked up too.

Aprendi a fazer bolos incríveis que nunca achei que fosse capaz de fazer. Taí, aprendi que sou capaz de muito mais do que eu já faço. Dei risadas até a barriga doer. Andei a pé até dar bolhas nos pés. Conheci, a pé, cada cantinho dos 20 arrondissements de Paris. Tomei muita chuva. Beijei debaixo de chuva. Conheci muitos lugares. Vi das coisas mais maravilhosas. Vivi coisas das mais maravilhosas. Vivi grandes dores também. Vivi um amor de verão. Vivi um amor de primavera. ‘Arrasamas’ muito e ‘brigamas’ com um estilista famosinho que achou que ‘brasileiro é bagunça’. Aprendi a querer muito. E a realizar muito do que eu quis.

Aos 26, repeti todos os palavrões em francês aprendidos com Brigitte Bardot. Aos 26, vomitei na linha 2. E na linha 5. Vi o Chico Buarque na linha 4. Ouvi ‘ai se eu te pego’ tocado com sanfoninha na linha 1. Fiquei entalado na linha 12. Dancei na linha 8. Dormi na linha 3. Aos 26, continuo não sabendo disfarçar. Continuo fazendo muito pelas pessoas e esperando ainda mais. Fui chamado de ‘bonzinho’ por todos os franceses que conheci. Mas demorei a perceber que por ‘bonzinho’ eles queriam dizer ‘idiota’. Dormi de menos. Pensei demais. Idealizei demais. Escrevi demais. E também, fiz demais. Vi o sol nascer várias vezes, e me senti grato por isso. Tive ideias absurdas. Escrevi um livro que provavelmente nunca vai ser publicado. Aproveitei oportunidades. Senti borboletas no estômago. Amei demais. Amei de menos. E faria tudo o que fiz de novo. E de novo. E de novo. Afinal, je ne regrette rien.

Beijos nostálgicos, agora aos 27,

Gui

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