carta amarela #112 – coragem, querido coração
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Paris, 15 de julho de 2015
Queridos amigos,
Ando bastante emotivo. Acho que essa coisa de bater na porta dos trinta tem me deixado um tanto instável emocionalmente. E não é exatamente por estar ficando mais velho, ou mesmo saindo da juventude dos vinte. É lembrar de que a vida chegou aos trinta de uma maneira nunca esperada anos atrás.
Quando completei 15 anos, em 9 de agosto de 2000, escrevi uma carta pro meu eu aos 30. Ainda não abri a carta (claro que vai ser a primeira coisa que quero fazer daqui 25 dias), mas me lembro bem de algumas coisas que eu queria alcançar na vida até os 30. Me pergunto aqui onde é que realmente cheguei.
Meu ano número 29 foi um dos mais confusos da vida. Entrei nele achando que ia me casar com alguém com quem eu estava há algum tempo, que ia me mudar pra cidade que amo. Uma reviravolta virou meu mundo de cabeça pra baixo ainda no primeiro mês desse meu ano 29. Acho que foi pra melhor. Voltei ao Brasil decidido a fazer meu livro sair. E aí… Ele saiu. Mas foi uma das coisas mais complicadas e cheias de problemas que já fiz na vida. Tenho um grave problema de querer controlar absolutamente tudo do meu trabalho, e fiz cada pedacinho possível dele. Mas esqueci que eu dependia de muita coisa. Todo o meu planejamento foi por água abaixo e confesso que estava achando o livro um lixo uma semana antes dele ir pra gráfica. Tive uma crise de choro daquelas – eu estava há um mês trabalhando cerca de 13 horas por dia, 7 dias por semana e as olheiras só cresciam. Tudo foi atrasando porque eu dependia de muita gente – o dinheiro do crowdfunding custou a ir pra minha conta e precisei resolver muitas burocracias e problemas pra isso acontecer. As provas de impressão deram problemas, fotos precisaram ser refeitas quando o livro estava na gráfica, aquarelas sumiram no meio do processo, fui perdendo também os prazos. E me vi dedicando minha vida inteiramente a um trabalho que era um sonho, mas que parecia ter virado um pesadelo, uma bola de neve que ia aumentando e eu não conseguia fazer parar.
O livro finalmente saiu, e eu estava numa viagem de trabalho. Como não tive editora, precisei fazer tudo. Tentei deixar tudo o mais organizado possível no Brasil antes de viajar mas… Meu problema atual se chama Correios. Como é possível que um livro que saiu de BH chegou a Berlim antes mesmo de um outro que saiu no mesmo dia não chegar pra alguém de BH? Infelizmente nem os Correios sabem me explicar. Só sei que vou continuar fazendo meu possível pra que chegue pra todo mundo. Ser um marinheiro de primeira viagem é assim. E acho que é com esses erros e acertos que vou conseguir ser melhor numa próxima vez. Continuo orgulhoso de saber que consegui fazer algo tão planejado virar realidade. E uma realidade com a sinceridade que eu queria – no meio do caminho uma editora que quase publicou o livro queria que eu tirasse as referências ao fato que sou gay pra que ele pudesse vender mais. É, 2015 e o mundo é assim.
O que sinto é que vou continuar por aqui falando as coisas do meu coração. Tentando com bravura falar daquilo que tenho aprendido com a vida. Aprendi a querer menos. Já quis que as pessoas fossem mais gentis. Já quis que as ruas estivessem mais limpas. Já quis mais dias de sol. Já me frustrei por querer muito – e não fazer nada pra mudar isso. Então faço minha parte pra que as coisas sejam melhores – mas não espero que os outros o façam também. Dói menos. Aprendi a não estacionar. Quanto mais parado fico, menos objetivos consigo realizar. Aprendi a pedalar sem rodinhas. E nisso caí e quebrei o braço. E foi de braço quebrado que aprendi a andar de bicicleta. Não deveria ser assim, mas muitas vezes aprendo as coisas com a fratura ali, exposta. Aprendi que a vida precisa ser vivida com coragem, sempre.
Aprendi também que aprendo coisas novas todos os dias. E que ainda sei muito pouco. Mas desse muito pouco aprendi a fazer as coisas com afeto. E que assim, eu consigo seguir mais feliz. Eu não conheço ninguém que não erre na vida. Não sinto vergonha dos meus erros, a gente nunca vai aprender nada se não tentar. Sempre lembro do meu pai falando que ele já errou muito tentando me educar, mas que ele errou querendo o meu melhor. Não tenho dúvidas disso. Vou seguir fazendo o que sei fazer como sei fazer. Erros acontecem. E muitos acertos também. É com os erros e acertos que a gente chega lá. Por isso mesmo continuo tentando.
Um grande abraço, sem abarcar o mundo, mas mais consciente do meu próprio mundo,
Gui
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