carta amarela #86 – bagagens
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Belo Horizonte, 23 de julho de 2014
Queridos amigos,
Certa vez alguém me contou uma historinha, dessas que servem como metáforas pra vida: Dois monges atravessavam uma floresta até que encontraram um rio. Um mais velho e um mais novo. Uma mulher estava ali e tinha dificuldades de atravessar o rio. O mais velho a colocou sobre os ombros e a ajudou a atravessar. Passado isso, os monges continuaram seu caminho, e o mais velho percebeu que o mais novo estava inquieto e perguntou: “O que inquieta sua mente?” O mais novo respondeu: “Se nós monges não devemos tocar em mulheres, por que você a colocou sobre os ombros?”. O mais velho prontamente respondeu: “Eu deixei aquela mulher há algumas horas na margem do rio, mas parece que você a carrega sobre os ombros até agora”.
Faz alguns dias que deletei minha página pessoal do facebook. Das coisas que mais me irritavam – que fique claro, é só um dos inúmeros motivos pelos quais deletei – é como as pessoas perdem tempo levando tudo para o lado pessoal. Provavelmente aquilo que escreveram ali não era direcionado à você; talvez por um esquecimento qualquer um amigo não te marcou numa foto; talvez ainda não responderam seu whatsapp porque estão ocupados com algum trabalho, ou mesmo dentro do cinema; talvez aquela resposta em e-mail que você aguarda há uma semana ainda não foi respondida porque seu amigo gostaria de poder te escrever com calma, um e-mail querido e com resposta completa, e por isso ainda não respondeu. Talvez seu namorado não esteja triste por causa de uma coisa que você fez, e sim porque ele está triste com outras coisas da vida.
É fato, o mundo não gira em torno de ninguém. Uma das últimas coisas que postei naquele facebook foi que tinha ficado triste que o Jamie Oliver tinha chamado nossos doces de porcaria. Não acho que foi com má intenção, acho que só faltou um cuidado e gentileza, ele poderia só ter falado que não gostou muito ou que achou muito doce para o seu paladar. Foi isso meu post. Acabou inundado de comentários. A maior parte dos comentários eram verdadeiras ofensas a ele: “Idiota!”, “Babaca!”, “Esse cara sujo vem falar assim da gente!”. Não acho que é pra tanto. Todo mundo fala alguma merda de vez em quando, eu me incluo no time que fala muita merda, aliás. E sempre vai ter um monte de gente pra despejar pedras em cima da gente. Mas aí veio o pior. Apareceu gente para defender a honra de Oliver e o post virou uma baixaria e briga interminável por conta de uma… Bobagem?
Gosto de falar que cada um tem uma mochila nas costas. Querendo ou não a gente vai guardando um monte de pedrinhas dentro dela. A maioria é minúscula, quase um grão de areia. Uma má resposta que um amigo te deu; aquela indireta no facebook que você achou que era pra você; essa superioridade de achar que seu gosto, seja pra música, comida ou que for é melhor que o dos outros. E assim a gente vai carregando uma bagagem cada vez mais pesada. Acho que é por isso que eu vejo tantos velhinhos desses que reclamam o tempo todo de tudo na vida. Espero um dia conseguir trocar todas as pedrinhas por flores. Essas sim, além de encherem os olhos de beleza, são muito mais leves também.
Um abraço,
Gui
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