carta amarela #51 – o melhor chocolate do mundo

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Belo Horizonte, 20 de março de 2013

Queridos amigos,

Dia desses uma cliente veio buscar um bolo em minha casa e me perguntou: “Qual é o melhor chocolate do mundo? É o belga?” E eu respondi que não. Ela me olhou surpresa e disse que todas as brigaderias gourmets usam chocolate belga. Ri e disse a ela que aqui no Brasil tudo tem ganhado essa tarja de “gourmet”, pra vender produtos melhores a preços mais caros ainda.

Ela insistiu: Mas então qual o melhor chocolate? Tentei explicar usando a comparação da carne de boi, dividida entre carne de 1ª e carne de 2ª. A carne de segunda não pode ser de forma alguma considerada inferior como muita gente pensa. Não dá pra usar filé pra fazer sopa e nem músculo pra fazer bife. Cada carne fica excelente se feita na preparação correta. Lembrei-me de quando estagiei na Pâtisserie de l’Église e lá existia uma despensa só de chocolates. Era climatizada e cada prateleira tinha uma plaquinha. Tínhamos vários chocolates, todos feitos na Europa, mas com matéria prima vinda do Brasil (as sementes cultivadas aqui são maravilhosas, não o chocolate que fazemos), Venezuela, Costa do Marfim, Madagascar, Caribe e América Central. Meu chef me explicou que eram desses lugares o melhor cacau do mundo. E, pra cada tipo de semente, um tipo de sabor, assim como temos grãos de cafés diferentes. Cada um desses chocolates ia pra um doce diferente e assim fazíamos bombons e doces maravilhosos, cada qual a seu sabor.

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Recordei também de um querido amigo francês. Sempre enjoadíssimo pra comer doces. Achava muitos deles doces demais. E um dia, no metrô, comprei numa daquelas máquinas um pacotinho de Kinder Bueno pra passar a fome. Nem ofereci, achei que ele ficaria até ofendido. Mas ele veio me pedir um pedaço. Assustei, mas estendi a mão a ele. Ele deu uma mordida e abriu um largo sorriso: “Passei minha infância inteira comendo isso”. “Mas não é doce demais?” – perguntei. “Não importa, pra mim tem sabor de felicidade”.

E aí entendi qual era o melhor chocolate do mundo. E respondi à minha cliente: é aquele que, pra você, tiver sabor de felicidade.

Um beijo melecado de chocolate,

Gui

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  • Lindo texto! Sou fã de chocolate e muito exigente também. Com a idade e a apuração do paladar fui gostando mais dos amargos, que também são melhores para a saúde. Comer meus 30 gr de chocolate amargo depois do almoço para mim é minha dose de felicidade diária. Custei a encontrar um chocolate que fosse econômico e do jeito que eu queria, mas hoje encontrei meu “chocolate metade”. É difícil sim encontrar no Brasil bons produtores de chocolate, mas felizmente descobri um achado. Prefiro evitar propaganda, mas pode ser que minha recomendação ajude alguém a encontrar sua felicidade em forma de chocolate. Compro chocolates “no quilo” mesmo da linha “Unique” da Melken. As outras linhas da marca não são muito boas mesmo não, mas a “Unique” é diferente. Em Belo Horizonte vende no Maria Chocolate, mas na internet (lojadobondinho) tem mais barato e no formato “em gotas” em vez de em barra, o que facilita para trabalhar em receitas. Tem várias graduações de cacau, eu prefiro a 70%, que é a maior. Meu brigadeiro, que uso de recheio para bolo, é com esse chocolate e creme de leite para ficar ainda mais cremoso e menos doce. Pode testar viu Gui!

  • Que lindo o post, Guilherme. Descobri o seu blog há poucos dias e estou adorando. Tenho o meu também (http://www.allweneedisfood.com), mas o maior propósito dele enquanto eu estiver em Paris é contar sobre os restaurantes e pâtisseries que descubro aqui.
    Estou começando a fazer cursos de cozinha e pâtisserie aqui. Cozinha, vou fazer na Ferrandi (vou fazer o básico profissional em francês e depois vou escolher outros). E o curso de pâtisserie eu ainda não decidi direito, mas estou pensando na Lenôtre (a Ferrandi já está lotada para o básico profissional). Você conhece a Bellouet Conseil? Se tivesse que escolher outra escola de pâtisserie em Paris que não a Ferrandi, qual você escolheria, por favor?
    Muito obrigada,
    Letícia

    • gpoulain diz:

      ah que delícia! e que vontade de voltar pra aí! é bom que vou anotando suas dicas pra quando eu voltar a visitar Paris.

      todo mundo me fala da Lenôtre (aqui no Brasil), mas nunca vi ninguém me falando dela na França. enquanto pâtisserie eu não gosto muito das coisas de lá, mas não sei falar do curso deles!

      não sei outras escolas pra te indicar… acho difícil, porque quando pesquisei tudo me indicou pra Ferrandi e curti muito fazer o curso lá, ainda mais que foi a única que me garantiu estágio onde eu quisesse, e eu bem sei o quão é difícil arrumar estágio em Paris sem ter alguém pra me indicar, sabe? então isso contou muito pra mim.

      • Oi Guilherme,

        Obrigada pela resposta. É verdade, os franceses só indicam a Ferrandi. Visitei a escola e adorei. Para mim ela ficou em 1o. lugar em todos os quesitos.

        Mas como o curso de pâtisserie deles já está lotado, estava pensando em fazer o básico na Lenôtre e depois fazer as formações curtas da Ferrandi para complementar. Só conheço uma pessoa que estudou pâtisserie na Lenôtre e ela adorou, mas estou tentando colher mais opiniões.

        Muito obrigada.

        Letícia

  • Mariana diz:

    Belíssimo texto, pra variar! 😉
    Amei! beijos

  • Essa coisa do chocolate perfeito é interessante né? Me identifiquei com a história do seu amigo Frances… Ano passado passei a Páscoa em Bruxelas… Meu ovo de chocolate foi pequenininho, mas feito do puro chocolate belga, esse mesmo que tem fama de ser o melhor… Comi, gostei e só… Esse ano meu marido falou pra eu escolher o ovo que queria (quase todo ano ele me da um Kopenhagen da vida), e sabe qual foi minha escolha??? O bom e velho Ouro Branco da vida… Pra mim ele tem exatamente esse sabor de felicidade! (Palavras de uma chocólatra!)

  • Rosa diz:

    É incrível seu olhar nas mais diversas situações. Me surpreende sempre a lucidez, simplicidade e grandeza que é um luxo só!
    Não tenho nenhuma facilidade com as palavras e você me encanta com sua escrita.
    Ah!… a felicidade!….um pedacinho de rapadura…chocolate amargo…um café…uma crônica doce do Gui!..hummmm
    Bjo, muita luz!

  • Já tinha passado por aqui antes, mas depois que tive a oportunidade de conhecer você (e seu trabalho incrível) estou vendo tudo com outros olhos.
    A pouco mais de meia hora tô aqui devorando post por post. haha
    Que delicadeza e graça de ver a vida! Adorei! Vou reservar parte desse sábado pra testar uma das suas receitas, ligar uma musiquinha e curtir essa vibe boa! 😀

    Beijo grande, Gui!

    • gpoulain diz:

      Ei Nat! Eu que amei conhecê-la! Fico feliz que tenha gostado e depois me conta qual receita testou. Mas o mais delícia é isso mesmo, pegar um momento sem muito a fazer (tipo um sábado), ligar a música e aproveitar o momento! Um grande beijo!

  • Tb tenho um pouco de birra de coisas que são “as melhores do mundo”. No meu ambiente, o melhor do mundo sempre significa atendimento ruim, serviço pior ainda ou massificação de sabores.
    Prefiro achar que existem o “melhor do mundo para cada situação”. Sabe aquele guarda-chuvinha bem vagabundo feito de parafina? Pois é, ele é o melhor do mundo em uma parada de beira de estrada na viagem de final de ano com os amigos, ou quando a gente tá passeando no centro da cidade e encontra aquele velho cigarrinho de chocolate ou moeda do pirata!
    O chocolate belga realmente é muito gostoso e tal, mas não é porque é belga que significa que o resultado da receita vai ser bom. Tem muito restaurante/brigadeiro/docinho por aí utilizando chocolate belga de péssima qualidade e cobrando um absurdo, afinal, tenho certeza que pelas bandas de lá tb tem cacau ruim e chocolate de “segunda linha”, igual aqui tem bons chocolates, como aqueles do sul da Bahia.
    Enfim, chocolate é na verdade uma comfort food e pode ser apreciado em todas as suas formas e variações, mas assim como vc Gui sempre nos mostra, quando ele leva aquele toque de afeto, fica ainda mais delicioso!

  • “Sabor de felicidade”, um daqueles termos que eu passarei a usar e dizer em seguida que li num blog uma vez e queria ter escrito. Lindo!

  • Simone diz:

    Oi, Gui.

    Sou uma das suas muitas admiradoras. Te sigo no insta e vivo comentando lá (e você sempre cordial, me responde com o dobro de carinho!).

    Estou pesquisando sobre um curso de pâtisserie na França e, googlando, acabei caindo aqui por um dos comentários. Eu sou apaixonada por fazer doces e sempre quis estudar Gastronomia. Acabou que por falta de oportunidade na época ($) e também por gostar da área de exatas, cursei Computação e virei analista de sistemas. Mas sou daquelas que vive fazendo doce pra levar no trabalho e que é apaixonada pela confeitaria. Acontece que no último mês minha vida deu uma reviravolta. Já estava cansada da minha profissão há um tempo e então, pra completar, meu marido resolveu se separar. Meu mundo desabou. Tive que voltar pro interior pra cidade dos meus pais porque fiquei sem casa e tudo mais. Enfim, neste meio tempo comecei a pensar se não valeria a pena investir no meu sonho. Já estou com 30 anos e talvez seja essa a minha oportunidade. Desculpa eu contar a história toda, é só pra não parecer muita loucura (e como ainda estou meio mal, contar às vezes me alivia, sabe?). =’)

    E aí entra você pra me dar uma opinião (se quiser, claro!). Li muito sobre a Ferrandi e sobre a Lenôtre, mas como sou leiga nestes cursos de exterior, estou perdida. Vi que você falou sobre as oportunidades de estágio pela Ferrandi serem melhores. Mas em relação à experiência profissional? As escolas exigem ou consigo entrar mesmo sendo amadora? Já fiz cursinhos básicos de curta duração, mas queria me profissionalizar. Você indicaria a Ferrandi? Dizem ser apaixonante. É isso tudo mesmo, vale o investimento?

    Desculpa se foi demais meu comentário e meu pedido de ajuda, viu, Gui. =)

    Obrigada!

    • gpoulain gpoulain diz:

      ei! não sei falar muito sobre a Lênotre, a Dani Noce já deve ter falado um pouco mais sobre isso, imagino. pra fazer Ferrandi você não precisa saber nem o que é faca, na verdade, a gente aprende até isso no primeiro dia de aula. sério! haha! eu amei meu investimento sim, aprendi muito. mas sei de gente que também não gostou. eu falo pra todo mundo que quem faz o curso é o aluno, não importa em que escola seja. talvez o que se aprenda lá é o mesmo que em outras escolas no Brasil. pra mim influenciou mais viver a vida num ambiente e cidade cheio de pâtisseries. isso tudo me inspira, em ilustrações, doces, em tudo. o estágio foi bem legal pra aprender mesmo, no dia a dia. é algo legal pra por no currículo também. é difícil te dizer se vale o investimento. pra mim valeu. espero que tenha ajudado de alguma forma. um abraço!

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