carta amarela #128 – bloco dos não sozinhos
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Belo Horizonte, 10 de fevereiro de 2016
O moço do balcão estava visivelmente nervoso. Andava de um lado para o outro, passando pelas portas da cozinha, dessas que vão e voltam como aquelas que a gente via sempre batendo em alguém nos desenhos animados. Suava frio, pedia desculpas e parecia preocupado comigo. Me entregou um endereço, escrito em letra trêmula, que ele repetiu continuadamente até que eu sumisse pelo portão: é o seu direito!
Uma senhora ouviu aquela conversa. Logo veio palpitar, se desculpando por tal feito, e deu uma nova sugestão de trajeto. Muitas recomendações, assim como uma tia preocupada. Já na esquina, chamou João e pediu para ele chamar um taxi. O taxista se preocupou em me deixar no ponto mais seguro. Falou: “corre, vou lhe ajudar”. Deu dicas não solicitadas e aconselhou muito, muito cuidado. Desejou boa sorte, da janela, e boa noite – é bom também, disse.
Você virou as costas. Justificou por traumas passados. Quem é abandonado, justifica, pode abandonar quando bem entender. Se afogou em beijos vazios, em murmúrios e desalentos, cerveja, blocos e confetes.
Aquele moço do balcão, aquela senhora, o João da esquina e o taxista, esses sim nunca estarão sozinhos. Não tinham a menor obrigação em estender a mão, mas foram os que nunca conseguiriam virar o rosto e se ausentar. Respirei. Quando a gente é bom com a gente mesmo é mais fácil sentir compaixão pelos outros também. Se perdoar é entender que a lição foi aprendida com um erro e isso é importante pra gente ser alguém melhor. O confete passou e carregou qualquer mágoa junto. Vejo da minha janela ruas vazias. Pensei nos momentos bons do carnaval. Lembrei dos reencontros. Se todo carnaval tem seu fim, que esse fim seja o começo de novas felicidades.
Um abraço, ainda tentando tirar toda a purpurina da barba,
Gui
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