carta amarela #106 – dançando sozinho

carta amarela #106 – dançando sozinho

Belo Horizonte, 11 de março de 2015

Queridos amigos,

Tem dias que a gente recebe uma dessas notícias que jogam a gente lá embaixo. Eu sempre tive uma mania ruim de me sentir a menor pessoa do universo nessas horas. O bom é que a gente vai mudando com a vida. Sexta-feira foi assim: chorei, quis colocar “Dancing On My Own” da Robyn pra tocar. E ouvi uma, duas, três, quatro, cinco vezes. Girei pela cozinha enquanto fazia bolos. Lembrei que mesmo que eu continue dançando sozinho, essa música me faz lembrar de várias das pessoas que eu mais gosto na vida. Já vi Robyn cantando essa ao vivo agarradinho numa amiga; já pulei quando tocou em festas divertidas na casa de amigos; já passei um ano novo épico em que dançamos todos juntos. Lembrei de viajar de carro pra SP cantando muito alto essa música enquanto dirigia. No fundo, na verdade, não estou nunca dançando sozinho. E aí vem a sensação boa de que as dores vem, batem com força, mas a vida continua. E eu continuo gostando da vida.

O sábado chegou, entreguei meu último bolo naquele dia. Saí andando a passos largos, todo inquieto em busca da banca mais próxima. Entrei na primeira que vi com o coraçãozinho meio disparado, já corado de vergonha só de pensar que o jornaleiro pudesse me reconhecer. Nunca, nunquinha imaginei que alguém um dia ia me colocar numa capa de revista. Foi estranho. Mas bateu um orgulhinho lá no fundo de que talvez eu esteja fazendo a coisa certa. Nesse mesmo sábado quase perdi um avião pro Rio. O aeroporto Santos Dumont estava fechado por causa da chuva. Fiquei inquieto. Achei que ia perder meu compromisso. Atrasei mas cheguei. Foi muito estranho me ver entrando no Copacabana Palace, um hotel que nunca imaginei entrar. E ali, rodando um pouco na festa à qual fui, fui vendo várias pessoas que me acostumei a ver da telinha da TV. Todo mundo muito arrumado, sorridente. Me senti feliz ao pensar que a Rede Globo havia me levado ao Rio pra participar do lançamento da nova novela das 9. Daquelas coisas que eu não esperava que um dia ter um blog pudesse me proporcionar. Me senti grato com as oportunidades.

Foi daquelas noites em que não quis dormir. O dia ia amanhecendo, bem nublado. Desses dias que normalmente chamamos de “feio”. Troquei os sapatos por chinelos. A calça por shorts. Cheguei na praia, larguei os chinelos e me pus a caminhar pela areia. Uma brisa serena vinda do mar. A água fria batendo na ponta dos dedos. Aquele infinito de perder de vista que, como mineiro, tenho poucas vezes a chance de ver. É estranho como algumas vezes a gente pode se sentir meio triste e meio feliz ao mesmo tempo. Da vida que vai dando certo por um lado, errado pro outro. Mas que a gente vai tentando equilibrar como dá.

Vi um pai ensinando um filho a andar de bicicleta sem rodinhas. O menino caía, se esfolava todo, levantava na mesma hora e se punha a tentar de novo. Lembrei de quando eu era criança. Eu caía, machucava, colocava um band-aid e voltava a brincar. Lembrei de quando quebrei o braço, e ao chegar na escola parecia um herói, afinal eu tinha caído tentando alcançar o galho mais alto da árvore. Não sei quando exatamente mas a gente cresce e começa a se importar com os machucados. A gente não quer se machucar e paramos de arriscar. Por um coração quebrado a gente veste uma armadura pra não deixar ninguém entrar. Por medo do fracasso, deixamos de tentar várias daquelas vontades de lá do fundinho da gente.

Olhei de novo pro horizonte lá atrás do mar, daqueles que a gente se confunde quando mar e céu estão azuis. Lembrei de um conselho que alguém querido me deu: seja bom, trabalhe muito, seja humilde, sorria sempre, seja leal e honesto, viaje quando possível, nunca pare de aprender, seja grato sempre e ame. Não dá pra saber o que vem por aí. Coloquei meu fone de ouvido. Robyn gritou “eu continuo dançando sozinho”. Sorri. Vou persistir. Mesmo com os machucados.

Um abraço bem forte,

Gui

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  • Mariana D. diz:

    Parabéns, Gui! Você vai longe…acho que já disse isso (algumas vezes hehe). Beijo!

  • Mundobrel diz:

    Você acredita que eu coloquei Dancing On My Own para ouvir enquanto lia o post? hahaha. Me identifiquei.
    O post está lindo. O segredo é focar nas coisas boas. Se não tivesse coisas ruins não valorizaríamos as boas.
    Abraço!!

  • diz:

    “…mas bateu um orgulhinho lá no fundo de que talvez eu esteja fazendo a coisa certa.”
    Olha, só posso dizer que na minha percepção, vc está sim fazendo a coisa certa e brilhando muito! Colhendo lindos frutos do seu trabalho, dedicação e afeto que espalha por aí! (as fotos da revista estão o máximo! adorei!)
    E essa festa luxo da Globo, hein?!!? Mega bacana… esse blog tem muito poder, vc nem imagina!!! Continue alimentando ele com todo esse carinho que sempre virão coisas boas! Bjos

  • Thais diz:

    Gui leio as suas cartas e faço as suas receitas faz um tempinho já. E esta internet nos deixa próximos de pessoas que nunca imaginamos e nos imaginamos amigos destas pessoas. Foi isso que eu senti com esta carta. Gostaria de saber escrever como você, suas cartas são leves, obrigada por compartilhar.

    • gpoulain gpoulain diz:

      eu escrevo aquilo que vem de dentro. não preciso florear nem nada. acho que talvez por isso sejam leves. que bom que se sente assim!

  • Rogéria diz:

    Gui, me emociono com todas suas cartas amarelas.
    São tão verdadeiras… me sinto dentro delas… têm alma!
    Parabéns peloseu sucesso! Vc merece!
    Bj

  • Uma amiga me enviou esse texto por e-mail. Disse que tinha lido num blog:

    “Meu amor,

    li hoje um textinho num blog…
    o nome do texto é ‘Dançando sozinho’. Achei tão lindo.. Me fez pensar que ainda há esperança no fim do túnel… To te mandando.. .Qm sabe pra vc também funcione dessa maneira.”

    Eu tenho essa mania de dançar sozinho. Como disseram num dos comentários acima, eu também baixei a música que ainda nem conhecia pra ouvir durante a leitura. Encantei.

    A minha é Tempo Perdido. Eu sempre consigo me lembrar que ainda o tenho. Hoje é daqueles dias em que eu vejo que deixei muito dele passar, ainda que na casa dos vinte anos. Mas tem os outros dias, sabe? Aqueles em que eu vejo, num horizonte tao azul e sem saber se céu ou mar, o quanto de tempo ainda tem pra que eu possa me encontrar. Eu gosto de dançar e entro na dança sozinho ou acompanhado. Mas tem esses dias, os dias em que dançar sozinho parece triste, mas só eu sei da felicidade dos meus próprios passos no salão. :)

    Obrigado pelas doces, lindas e sinceras palavras.

    • gpoulain gpoulain diz:

      eu acho que sempre há tempo pra tudo. pra mudar, pra aproveitar mais. a gente vai amadurecendo com o tempo, vai entendendo melhor algumas coisas. é bom dançar sozinho também. se descobrir um pouquinho.

      um grande abraço, e ainda responderei todos os seus comentários, com o tempo.

  • Sofia diz:

    Parabéns, moço. Adoro ler nesse formato! 😉

  • Rosa diz:

    Te amo!..Você chegará onde quiser, pq é talentoso, humilde, muito inteligente, lindo e muito amado por tanta gente, querido!
    Bjs com carinho e na torcida pelo seu sucesso.

  • Anita diz:

    Ownn…. gosto tanto de vc! Ler qualquer coisa que vc escreve deixa meu dia muito mais feliz!
    Queria tanto ter encontrado vc aqui no RJ!
    Ainda faço um chaveirinho com vc para carregar vc na bolsa comigo o tempo todo!
    Vc me faz querer ser uma pessoa melhor Gui….

    • gpoulain gpoulain diz:

      oi Anita!

      fiquei só 15 horas no Rio, acredita? minhas passagens era pra um tempo bem curtinho. mas amo o Rio e espero voltar com mais calma.
      fico muito muito feliz que você se sinta assim!

      um abraço!

  • Sandra diz:

    hahhahah
    tbm coloquei a música para tocar enquanto lia o texto….

    adorei o texto!!

    Sandra

  • Nay diz:

    Como as suas palavras me fazem bem… parece que você consegue traduzir coisas que estão em mim, bem guardadas, debaixo da minha armadura para que não haja machucados!!
    Aproveito para agradecer a um grande amigo que me apresentou toda a sua delicadeza… @mitch_prado tks forever

  • o que eu mais gosto das cartas amarelas é que a gente tem um “caralho de sintonia” (ou sei lá o quÊ) que sempre me faz vir aqui e de alguma forma, em alguma parte da carta, encontrar um pedacinho falando diretamente pra mim “lucas, veja bem…”. Hoje saio mais uma vez do seu site com a gostosa sensação de ter sido indiretamente aconselhado por você, de uma maneira singular, sincera e doce que só você tem! hoje saio com “de que as dores vem, batem com força, mas a vida continua. E eu continuo gostando da vida.” pq eu sou igualzinho e “seja bom, trabalhe muito, seja humilde, sorria smp, seja leal e honesto, viaje qd possível, nunca pare de aprender, seja grato smp e ame”. VOCÊ É UM AMORZÃO e eu gosto MUITO DE VOCÊ. Se um dia decidir largar as cartas amarelas me passe emails dizendo tudo isso pois tenho o maior prazer em ler. UM BEIJO BEM NA TESTA E UM ABRAÇO DE FILHO EM PAI <3

  • Patricia diz:

    Sempre visito sua página e fico encantada com as receitas e com as cartas, mas nunca comento… Hoje tive que abrir uma exceção pra te agradecer por uma carta tão bonita e inspiradora.. Me deixou uma sensação de muita serenidade ver mais alguém com inquietações e sentimentos como os meus.
    Muito obrigada, Gui, e mil parabéns pelo trabalho maravilhoso que você faz.

    • gpoulain gpoulain diz:

      oi Patricia! eu fico super feliz quando alguém aparece aqui pra comentar e eu descubro um leitor que eu nunca tive contato!
      que bom que ficou serena, muito obrigado pelas palavras. um abraço!

  • jusciene mendes diz:

    Lindo texto, parabéns Gui.

  • Larissa diz:

    Muito e seu texto.Muito real,muito visceral,me emocionou!!!Parabéns!

  • Ana Paula Nunes diz:

    Gui,
    Além de um ótimo chef, você é um ser humano fantástico. Que turbilhão de emoções é a sua alma!
    Escreva sempre, sempre, sempre!

    É muito amor envolvido!
    Obrigada!

  • Isa diz:

    Gui, tomei a liberdade de copiar essa ilustração maravilhosa e colocar de fundo de tela no meu computador, ultimamente ando copiando frases lindas e inspiradoras pra olhar nos momentos em que sinto que vou fraquejar e me animar um pouco…
    Você é uma puta inspiração pra mim, não só como confeiteiro mas como ser humano também, mesmo assim não consigo te colocar num pedestal, você é gente como a gente, cheio de dúvidas e buscas e esse é seu encanto <3

    Um beijão e vamos tocar esse barco com amor, que assim a onda machuca mas não derruba nunca. :)

    • gpoulain gpoulain diz:

      muito obrigado Isabella! e não tem mesmo que colocar em pedestal nenhum, sou igual a todo mundo! :)
      vamos tocar esse barco em frente sim. um beijão!

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