carta amarela #101 – dos sentimentos inflacionados
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Belo Horizonte, 02 de fevereiro de 2015
Queridos amigos,
Minha vida não é plena de felicidade. Mas a de ninguém é. Há uma ilusão muito grande a respeito de duas coisas: felicidade e amor. O cinema, as histórias, a publicidade, tudo vende uma vida linda, um final feliz. E as pessoas tem perseguido isso exaustivamente. E com isso mais e mais casos de infelicidade. As pequenas conquistas não são celebradas, afinal, o amor não é perfeito, o trabalho não é perfeito. É uma constante insatisfação com a vida. Podemos até achar que aquele amigo é mais feliz, que o vizinho é mais feliz, que o trabalho do outro o faz mais feliz. Isso, claro, só joga a gente ainda mais pra baixo.
Dia desses ouvi um amigo dizer que não procurava mais o amor, pois estava cansado de sofrer. Que tristeza é ouvir isso! Sofrer é parte da vida também. Muitos dos meus sofrimentos me fizeram uma pessoa melhor. Uma pessoa mais forte. E me fizeram até uma pessoa mais sensível perante aos esforços alheios também. Construo minhas relações com base em confiança, respeito e tolerância. Já celebrei relacionamentos imperfeitos, celebro também cada dia que vendo um bolo. É só um bolo, mas cada um deles me faz ser um profissional cada vez melhor. Cada um deles me traz um pouquinho mais de dinheiro. Cada um deles faz uma família ou grupo de amigos mais feliz por alguns momentos.
Sinto que essa nova geração foi criada com tudo muito fácil – me lembro de ter que percorrer livros e barsas pra fazer trabalhos de escola – que ainda tinham que ser escritos à mão com a caligrafia mais caprichada possível. Daquela época que não tinha o tio google pra responder tudo o que a gente precisa saber. A gente teve cada vez mais facilidades e liberdades e no fundo não sabemos lidar com isso. E daí a grande frustração ao entrar no mercado de trabalho, a grande frustração ao ir ali viver a vida: nada é fácil, nada vem na mão. É porque esquecemos também do valor de um outro conceito: esforço.
Tenho sido mais feliz ao tentar simplificar a vida. Consumir menos, querer menos coisas muito distantes da minha realidade, aprender a ser feliz com o que sou e tenho. Aprender que sofrer também faz parte, a vida é transitória: há momentos tristes, mas também há os felizes. Que os amores são imperfeitos, que príncipe encantado só existe na ficção. Que meu trabalho às vezes é chato, que a semana é feita também de segunda a sexta, e não só de sábados e domingos. Sentir feliz simplesmente por um abraço apertado de alguém querido.
Tenho aprendido a gostar da vida. Afinal, já disse aqui várias vezes, a vida só gosta de quem também gosta dela.
Um abraço apertado,
Gui
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